quarta-feira, 23 de dezembro de 2015

Novos prédios têm carro e até imóvel para uso coletivo

20/12/2015 - Folha de São Paulo

Você precisa de uma furadeira, mas não quer comprar uma. Gosta de ter a opção de andar de carro, mas só de vez em quando. Pensa em trabalhar fora do escritório, porém não tem espaço em casa. Nada disso é um problema se você morar em um condomínio com serviços compartilhados.

Tendência já consolidada em diferentes setores, como transporte (com o aplicativo Uber) e aluguel de temporada (com o site Airbnb), a economia compartilhada chegou ao prédios residenciais.

Exemplo disso é um dos prédios recém-lançados pela construtora Gafisa em São Paulo. Com entrega prevista para 2018, o Smart Santa Cecília terá bike e "car sharing" -expressões usadas para descrever estações com bicicleta ou carro de uso comum.

Além disso, os prédios terão um apartamento coletivo. Mediante o pagamento de uma taxa definida pela administração do condomínio, o morador poderá receber hóspedes no imóvel, decorado pela construtora. O prédio ainda tem unidades à venda, a partir de R$ 198 mil (26 m²). 

ÁREAS COMUNS 

Não é de hoje que os condomínios têm espaços coletivos, mas antes eles ficavam restritos às piscinas, salões de jogos e churrasqueiras, explica a economista e professora da ESPM Neusa Souza.

"É muito acertado as incorporadoras oferecerem outras oportunidades de compartilhamento. O comportamento social passou a ser mais sustentável e repensou os padrões de consumo", afirma.

Outra incorporadora que aposta no conceito, em São Paulo, é a Vitacon. Além de bicicleta e carro compartilhados, os prédios da empresa vêm com caixa de ferramentas e salas de "coworking".

"Faz parte de uma mudança social. As pessoas estão menos apegadas à ideia de ter coisas e buscam uma eficiência maior nos recursos", afirma o CEO da empresa, Alexandre Lafer Frankel.

A analista de RH Camila Barossi, 26, se mudou há pouco mais de um mês para um apartamento no Vox Vila Olímpia, que tem estação de bicicletas e lavanderia coletiva. Os serviços contaram na hora de ela decidir pela compra do imóvel.

"Eu não tenho carro e, quando precisar, terei uma bicicleta à disposição. Vou andando para o trabalho e agora pretendo ir de bike", diz ela, que também quer usar a lavanderia coletiva.

Morador do mesmo prédio, o contador Jean Rodrigo, 27, conta que o valor da lavanderia vem embutido no condomínio. "Se eu fosse comprar uma lavadora e uma bicicleta, gastaria muito mais." 

SEM VOLTA 

Para Gustavo Reis, gerente de marketing da Tecnisa, o condomínio compartilhado é uma tendência sem volta.

"Existe um movimento de conscientização nesse sentido. Há todo um debate em torno da mobilidade urbana com as novas ciclovias."

A incorporadora tem seis empreendimentos na capital com bike e "car sharing".

Apesar de sempre existir, o ato de compartilhar objetos foi potencializado recentemente, de acordo com Souza. Um dos motores do compartilhamento é a tecnologia, que facilita a prática por meio de sites e aplicativos.

Seguindo essa lógica, a Gafisa pretende lançar um aplicativo para os futuros moradores do Smart Santa Cecília se comunicarem.

"Eles podem anunciar objetos que querem compartilhar e também pedir algo de que precisam, desde uma furadeira até a indicação de uma diarista", diz o diretor da Gafisa Octavio Flores.

Segundo ele, graças ao compartilhamento os moradores vão se livrar de gastos como IPVA, seguro de carro e hotel para parentes.

Para Souza, o grande desafio da economia compartilhada é a aplicação em larga escala. "Para atingir a massa é preciso mudar a percepção das pessoas", diz. Para ela, ainda existe a impressão de que as garantias de se compartilhar são poucas e os riscos são grandes, o que, na maior parte das vezes, não é verdade.

segunda-feira, 21 de dezembro de 2015

Paulista vira camelódromo com artesãos

20/12/2015 - O Estado de SP

SÃO PAULO - A aglomeração de ambulantes na Avenida Paulista transformou um dos principais cartões-postais da capital em centro de comércio popular. Tomadas por músicos e bandas nos fins de semana, as calçadas agora são disputadas em dias úteis por artesãos. Contagem feita pelo Estado mostra que a via tem quatro vezes mais vendedores do que permite a Prefeitura - são até 235 artesãos da Praça Osvaldo Cruz à do Ciclista, enquanto o limite é de 50.

A reportagem percorreu a via às 14 horas de sexta-feira. Desde o ano passado, com a Lei dos Artistas de Rua, de autoria da gestão Fernando Haddad (PT), os artesãos formam uma categoria regulamentada pela Superintendência do Trabalho Artesanal nas Comunidades (Sucato). O comércio é autorizado para ambulantes que produzem seus próprios artigos. Para quem não vende artesanato, a via não tem nenhum termo de permissão de uso (TPU) expedido - documento obrigatório para o comércio informal.

A proliferação recente de artesãos na região, com barraquinhas e mostruários espalhados pelo chão, é sentida por quem já atua na Paulista há mais tempo. "São uns 300 hoje, não? A Paulista é onde a cidade acontece”, diz a artesã Tereza de Jesus Neves, de 65 anos, que vende pulseiras, colares e anéis feitos à mão na via faz um ano.

A percepção de Tereza é confirmada pela história de Roseli Oliveira, de 46 anos. Vendedora de bonecos de biscuit, ela pediu demissão da empresa onde ficou por 15 anos para trabalhar por conta própria. Roseli começou a vender na via há duas semanas. Todo dia, ela sai de Ferraz de Vasconcelos, na Grande São Paulo. "Aqui o público é diferente. Conseguimos vender mais”, afirma.

Na Avenida Paulista há seis meses, a psicóloga Camila Almeida, de 40 anos, vende cartazes temáticos na esquina com a Rua Professor Otávio Mendes, ao lado do Museu de Arte de São Paulo (Masp). Seu principal público são os turistas. "A Paulista é o lugar onde as pessoas vêm passear. Todo lugar que você vai no mundo encontra uma grande avenida que vende artesanato local. Esse pessoal (artesãos ambulantes) não tem dinheiro para pagar aluguel”, diz.

Degradação. Para Lúcio Gomes Machado, arquiteto e professor da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, da Universidade de São Paulo (USP), a Paulista está "degradada”. Ele diz que a concentração de artistas e vendedores exige mais "cuidado” com a via.

"O lazer da população tem de ser distribuído entre os parques. Não se pode concentrar tudo só na Avenida Paulista. Com tanta coisa acontecendo ali, estamos engarrafando e acabando com a avenida, assim como aconteceu com a Praça da República e a Praça da Sé”, afirma Machado.

Em nota, a Prefeitura informa que agentes da Subprefeitura da Sé fiscalizam a via diariamente. Para evitar a degradação denunciada pelo urbanista, a gestão Haddad afirma também que vai pintar números de 1 a 50 nas guias, nos canteiros e nas calçadas para sinalizar os locais, em ambos os sentidos, onde o artesanato é permitido.

Na frente do Shopping Center 3, por exemplo, serão cinco profissionais. A intenção é evitar "engarrafamento” de pedestres. O lugar com a maior concentração de vendedores será diante do Casarão da Família Franco de Mello e do Parque Mário Covas: no máximo, oito. Com a numeração, a Prefeitura torna obrigatório o uso de tripés desmontáveis de 1,50 metro de largura por 0,70 m de comprimento. O limite de artesãos foi estabelecido pela Subprefeitura da Sé em janeiro, mas entra em vigor somente agora.

Calçada lotada. O analista de marketing Daniel Tazinaffo, de 28 anos, trabalha na região da Avenida Paulista e diz que às 18 horas a calçada "vira um inferno”. Para ele, falta um espaço regulamentado para a exposição dos produtos dos artesãos. "Eles geralmente ficam perto de metrô, onde tem a maior concentração de gente”, afirma.

Para Caio Lopes, de 35 anos, advogado em um escritório no cruzamento da Paulista com a Avenida Brigadeiro Luís Antônio, na maior parte do tempo os vendedores não interferem no seu trajeto. Lopes reconhece, no entanto, que "de vez em quando” é possível perceber o incômodo dos pedestres. "Tem horas que fica um pouco tumultuado, dependendo da localização do ambulante.”

A auxiliar de biblioteca Dayane Teixeira, de 28 anos, também trabalha na área e concorda que, dependendo do trecho, os artesãos podem obstruir a passagem. Ela cobra organização da gestão municipal. "Tem de existir um planejamento. Não pode só pensar no saneamento, em fazer uma limpa.”

O professor universitário William Freitas, de 29 anos, mora atrás do Masp e caminha até o trabalho. Ele percorre o trajeto há menos de um ano e disse que, nos últimos meses, percebeu um "aumento exponencial” do número de vendedores nos dias semana.

"No cruzamento perto do Masp havia apenas um senhora vendendo quadros de vinil no início do ano. Hoje, você se depara com uns seis ambulantes vendendo diferentes produtos só naquele cruzamento”, disse Freitas.