sexta-feira, 17 de maio de 2013

São Paulo quer repovoar o centro com Plano Diretor, mas famílias ainda resistem


17/05/2013 - iG – Último Segundo

O centro de São Paulo foi feito para trabalhar. É assim que boa parte das famílias de baixa renda enxerga a zona central da cidade, um dos principais temas em discussão do novo Plano Diretor Estratégico (PDE) , em revisão este ano. Embora a prefeitura planeje atrair para lá 20 mil pessoas com a promessa de trocarem os subúrbios por um bairro rico em serviços e transporte público, o local vem sendo povoado, principalmente, por solteiros e estudantes.

Região mais populosa da capital, com quase 4 milhões de pessoas, a zona leste poderia ceder ao centro algumas de suas famílias que, embora pressionadas pelo boom imobiliário de bairros como Carrão e Tatuapé, preferem se mudar para a regiões mais periféricas, como o extremo leste da cidade.

"Já não se vê muita gente da classe C morando no Tatuapé. Essas pessoas foram indo mais para as franjas da cidade”, avalia Fábio Araújo Pereira, membro do Conselho Regional de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável da Penha. "Aconteceu comigo também. Acabei me mudando de lá.”

A corretora de imóveis Roseli Lara Bastos diz que o Tatuapé "virou um lugar nobre”: "Um apartamento de dois dormitórios custa no mínimo R$ 450 mil, mas há unidades (de alto padrão) de até R$ 7 milhões”

Para a urbanista do Movimento Defenda São Paulo Lucila Lacreta, a escassez de terreno nas zonas oeste e sul obrigou o mercado imobiliário a buscar novas oportunidades, e a zona leste é a área possível. "Essas zonas de alto padrão expulsam os pobres, empurrados ainda mais para a periferia. Eles nem sonham com o centro”.

"A procura por aluguel na zona central é feita por estudantes, executivos. Morador solteiro. A cada dez procuras, só três são famílias”, contabiliza Alfredo de Freitas Gonçalves, corredor imobiliário no centro há 23 anos. "Um apartamento usado com dois dormitórios custa, em média, R$ 300 mil.”

A urbanista acredita que essa aversão familiar à região da avenida Ipiranga é natural. "É mais fácil se sentir protegido em um bairro horizontal do que em uma área cheia de prédios degradados. É um lugar impessoal”, acredita.

A corretora Roseli diz que os moradores deixam o Tatuapé com pesar. "Primeiro porque se tornou um lugar bonito, tem de tudo: lazer, cinema, teatro. Mas eles se vão para a Penha, Carrão, Vila Matilde, onde é possível encontrar um bom apartamento de dois dormitórios por menos de R$ 300 mil.”

Moradora há 12 anos do Tatuapé, a vendedora de cachorro-quente Cícera Helena, 42 anos, nem cogita a possibilidade de morar no centro. "Não conheço ninguém aqui que pense nisso. Eu retornei para o Nordeste por um tempo e, quando voltei para o Tatuapé, me surpreendi. Demorei três meses para encontrar uma casa. Aluguei dois cômodos por R$ 820. Quando morei aqui pela primeira vez eu pagava R$ 300”, conta ela. "Eu me mato de trabalhar, mas daqui eu não saio”, diverte-se.

"O mercado imobiliário busca a periferia, mas quanto maior a mistura de pessoas e classes, melhor a convivência”, avalia Pereira. "O ideal é ter gente de baixa renda vivendo perto dos Jardins para usufruir a infraestrutura local.”

20 mil no centro

No final de fevereiro, o prefeito Fernando Haddad (PT) e o governador Geraldo Alckmin (PSDB) assinam um protocolo de intenções para atrair 20 mil famílias para o centro com a ajuda da iniciativa privada.

Famílias da periferia não enxergam no centro um bom lugar para viver - Wanderley Preite Sobrinho/iG
Na parceria, o Estado entrará com R$ 1,3 bilhão, a prefeitura com R$ 400 milhões, enquanto o governo Federal deve participar por meio do programa Minha Casa Minha Vida.

A promessa é criar edifícios de moradia popular em imóveis sem uso. Os compradores pagariam uma prestação menor do que a média no centro - parcela mínima de R$ 125 e máxima de R$ 680.

Para Lucila, é preciso incluir os atuais moradores nesse replanejamento. "Não adianta entregar para a iniciativa privada. O Nova Luz foi um fracasso por causa disso.” Ela defende o modelo europeu, que revitalizou seus centros históricos abrindo crédito para que os moradores restaurassem as edificações.

Para deixar a região mais agradável, ela recomenda a construção de parques nos bairros vizinhos, já que o centro tem um dos menores índices de área verde por habitante: 6,18 metros quadrados por morador, contra os 2.655 metros de Parelheiros, na zona sul, segundo a Secretaria Municipal de Verde e Meio Ambiente.

"Não há espaço para áreas verdes no centro, mas pode-se incentivar a construção de parques nos bairros próximos, como Lapa, Brás e Vila Carioca, áreas industriais abandonadas que podem atrair essas pessoas que moram em lugares mais áridos. Os parques da Aclimação e Ibirapuera não recebem apenas moradores do bairro", conclui.

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