segunda-feira, 30 de maio de 2016

Haddad veta carros, retoma calçadão no centro de SP e enfrenta críticas

29/05/2016  - Folha de SP

Após mais de uma década aberta aos carros, a rua Sete de Abril, no centro de São Paulo, voltará a ser exclusiva para pedestres. Prometida para as próximas semanas, a obra é considerada pela gestão Fernando Haddad (PT) um teste do modelo de calçadões que deve ser adotado na cidade –e que é alvo de resistência.

Organizações do centro criticam a volta das restrições aos carros, que, segundo eles, acelerou o êxodo de empresas e escritórios da região. O diretor de desenvolvimento da empresa municipal São Paulo Urbanismo, Gustavo Partezani Rodrigues, argumenta que havia um "baixo fluxo de veículos ali" e que essa visão é "conservadora". "Estamos aperfeiçoando o modelo dos calçadões", diz.

O calçadão que Haddad promete entregar no próximo mês terá novos bancos e piso alinhado em blocos, que podem ser retirados sem quebrar. Haverá lixeiras com containers subterrâneos e novo sistema de drenagem.

Balizadores retráteis controlarão o acesso de carros autorizados. Em 2005, na gestão do então prefeito José Serra (PSDB), a Sete de Abril foi reaberta aos carros, em outro projeto-piloto, que se estendeu também à rua 24 de Maio. "Colocaram um pouco de piche e retiraram a área do pedestre, depois de 30 anos. Mas quem se atreve a dirigir no meio das multidões que circulam na rua?", questiona Rodrigues.

ATRASADA

Editoria de arte/Folhapress

Iniciada em setembro de 2015, a obra em dois quarteirões da rua Sete de Abril já deveria ter ficado pronta no mês passado. Ela está orçada em R$ 2,1 milhões. A prefeitura já manifestou interesse em, a partir do projeto-piloto na via, expandir esse modelo para outros pontos do centro paulistano.

Em abril, a gestão Haddad também chegou a bloquear, por uma semana, a passagem de automóveis e motos pelo viaduto do Chá. Questionada sobre uma adoção definitiva da medida, ela se limita a dizer que são "testes ainda".

O debate sobre o funcionamento dos calçadões existe desde setembro de 1976, quando os primeiros foram inaugurados pelo então prefeito Olavo Setúbal. Comerciantes diziam que haveria fuga de lojas e clientes para os shoppings, novidade então.

Novos terminais de ônibus e estações de metrô mantêm uma circulação estimada em 2 milhões de pedestres por dia, atravessando as ruas para fazer baldeações no sistema concentrado no centro. Garagens subterrâneas previstas não saíram do papel.

O superintendente da associação Viva o Centro, Marco Antonio de Almeida, afirma que a Sete de Abril aberta a carros era um "desafogo" de circulação. Ele reclama que, mais do que obras, a região dos calçadões precisa mesmo é de mais zeladoria.

"Não há fiscalização de horários para a entrada de viaturas e carros fortes, a manutenção do piso é muito ruim, assim como a coleta de lixo."

Para o diretor da Ação Local Piratininga, Carlos Beutel, que tem o restaurante vegetariano Apfel na Sete de Abril há 26 anos, a prefeitura "não ouviu ninguém" e só promoveu reuniões "quando já estava tudo decidido, para comunicar o projeto".

Morador do edifício Copan que promove caminhadas noturnas na região, ele acha que o centro de São Paulo precisa ser mais permeável. O modelo de calçadão que tem se expandido em várias metrópoles pelo mundo tem sido mais flexível que o retomado agora por Haddad.

A aposta em calçadões exclusivos para pedestres "não é a solução" para a decadência dessas ruas, às vésperas dos 40 anos de fechamento para carros, avaliam urbanistas ouvidos pela Folha.

"O pêndulo paulistano vai de um extremo ao outro. Passamos de uma prioridade absoluta de obras para carro para uma política anticarros", diz o arquiteto Milton Braga, professor da Faculdade de Arquitetura da USP (FAU-USP).

"Há um desequilíbrio [na área dos calçadões], com o chão superocupado, com muita gente andando e comércio popular, mas os andares altos estão subutilizados. Falta gente trabalhando ou morando ali", afirma Braga.

"Precisa virar um bairro normal, com mais residência e escritórios. É fundamental dar acesso aos carros dos habitantes, que precisam transportar cargas com conforto, malas e caixas, e muita gente com mobilidade reduzida."

O arquiteto Ciro Pirondi critica o modelo de não se deixar nenhum espaço para o automóvel. Ele é diretor da Escola da Cidade, faculdade de arquitetura a poucas quadras do Viaduto do Chá. "Permitiria uma pista para táxis e serviços. Se houver educação, é melhor compartilhar."

Pirondi diz que só se saberá do sucesso do novo calçadão, se a área for ocupada em outros horários. "Hoje é uma via de passagem, viva só entre 8h e 18h. Quando fecha o comércio, morre." Ele sugere um "trabalho de convencimento, de estímulo, para que bares, cafés e um mercadinho fiquem abertos à noite. Só gente na rua deixará a Sete de Abril segura", afirma.

PELO MUNDO

Nos anos 1970, quando eram novidade pelo mundo, havia cerca de 200 ruas exclusivas para pedestres nos EUA, segundo pesquisa do arquiteto Witold Rybczynski (a primeira foi aberta em 1957, em Kalamazoo, no Estado de Michigan). Nos anos 1990, o número tinha caído a apenas 30, especialmente em cidades universitárias ou turísticas.

Em Nova York, o então prefeito Michael Bloomberg dobrou as calçadas da Broadway e da Times Square, mas mantendo algumas faixas para a passagem de carros.

Na Europa, Copenhagen fez o primeiro grande calçadão nos anos 60, até hoje muito utilizado. Em outras cidades, como Florença, o centro histórico virou quase exclusivamente turístico.

A área pedestrianizada de Florença, de 120 mil m², uma das maiores da Europa, é menor que a do centro de São Paulo, de 130 mil m².

Respondendo às críticas, o arquiteto Gustavo Partezani Rodrigues, diretor da SP Urbanismo, empresa municipal responsável pela obra, diz que os calçadões já estão "sendo mais usados" e cita os "happy hours" de fim de expediente em bares na região.

Ele também afirma que "todo mundo faz compras sem carro" em ruas comerciais tradicionais, como a 25 de Março e a Santa Ifigênia.

Mas, para virar "bairro normal", Milton Braga, da FAU-USP, diz que só mesmo uma boa redistribuição do transporte coletivo da cidade, sem as baldeações de milhões de pessoas naquela área. "Incentivar também a abertura de mais galerias e passagens públicas nos térreos dos prédios, que multipliquem o espaço de circulação dos pedestres."

Elogiando o "piso melhor, o bom mobiliário e a aposta da prefeitura nos calçadões", o urbanista Carlos Leite, professor da FAU-Mackenzie, diz haver um movimento forte contra o carro como protagonista nas maiores cidades do mundo. Mas aponta um descompasso com as realizações.

"A obra de requalificação do Anhangabaú nem começou e o calçadão da Sete de Abril é uma parte minúscula. A prefeitura nem conseguiu abrir a Praça das Artes no Anhangabaú. O projeto é promissor, mas depois de quase quatro anos, é muito pouco."

CALÇADÕES PELO MUNDO

NOVA YORK (EUA)
Times Square e av. Broadway
> O calçadão da praça mais turística da cidade e as calçadas da avenida dos teatros dobraram de ta- manho entre 2008 e 2011, com o prefeito Michael Bloomberg. Nos dois ca- sos, uma pista para carros foi mantida. O movimento do comércio cresceu

MADRID (Espanha)
Áreas de Cortes, Las Letras, Embajadores e Ópera
> Calçadões foram espalhados pelo centro da cidade nos últimos?5 anos. Moradores, comerciantes e táxis podem entrar com seus carros a qualquer hora e têm "passes" limitados para carros convidados

BUENOS AIRES (Argentina)
Calle Florida
> A rua de 1,1 km virou calçadão em 1971. Em quase todas as transversais há trânsito normal. Na gestão do então prefeito Mauricio Macri, o número de quarteirões restritos triplicou, chegando a 135

ISTAMBUL (Turquia)
Avenida Istiklal
> Aberta no século 19, a avenida de 1,4 km virou calçadão em 1990. Só os bondes podem cruzar a Istiklal, mas carros são permitidos nas vias para- lelas. Cerca de 2 milhões de pessoas passam por ali todos os dias 

quinta-feira, 5 de maio de 2016

Faixa de pedestres diagonal em SP deixa de ser azul e é pintada de verde


04/05/2016  - Folha de SP

A faixa de pedestres diagonal no cruzamento das avenidas São João e Ipiranga, no centro de São Paulo, ganhou a cor verde em substituição à azul nesta terça (3). A mudança atende à determinação do Contran (Conselho Nacional de Trânsito), que padroniza nacionalmente a cor de fundo nas faixas de travessias diagonais.

A CET (Companhia de Engenharia de Tráfego) deu início à mudança no sábado (30). Os primeiros cruzamentos a receberem a alteração foram os do viaduto do Chá com a rua Coronel Xavier de Toledo e o das ruas Riachuelo e Cristóvão Colombo. Outros cinco ainda serão contemplados com a alteração na cor de fundo.

Em formato de "X", a faixa foi implantada no cruzamento cartão-postal do centro de São Paulo em janeiro de 2015. O desenho ajuda pessoas a atravessarem esquinas opostas de forma direta, e não em duas etapas. Esse tipo de sinalização é comum em Tóquio, no Japão.

A nova faixa reduziu o tempo de travessia em relação às faixas tradicionais de 159 segundos para 88 segundos. Segundo a CET, até 4.700 pessoas passam, por hora, pelo cruzamento da São João com a Ipiranga no pico da tarde.

segunda-feira, 2 de maio de 2016

Complexo viário será entregue pela metade na zona sul

01/05/2016  - O Estado de SP

SÃO PAULO - Com atraso e de forma incompleta, a gestão Fernando Haddad (PT) inaugura neste mês um complexo viário na Marginal do Pinheiros, na zona sul da capital. Apenas a Ponte Laguna, que dará acesso à pista no sentido Interlagos, está pronta. O projeto ainda inclui a Ponte Itapaiúna, a cargo da iniciativa privada e que está atrasada, e o prolongamento da Avenida Doutor Chucri Zaidan, que nem sequer começou. Esta última obra é considerada a mais cara e complexa do pacote e travou por causa da dificuldade de a Prefeitura desapropriar 264 imóveis situados no trajeto da nova via.

Prevista inicialmente para janeiro, a Ponte Itapaiúna, que fará o caminho contrário, no sentido centro, só deve ser aberta para o tráfego de veículos em setembro. A cargo da Odebrecht, é uma contrapartida da construtora por dois grandes empreendimentos multiúso erguidos na região. A Prefeitura os classificou como polos geradores de tráfego e, por isso, exigiu da empresa uma compensação pelo impacto no trânsito local, já bastante carregado. Juntas, as duas pontes têm custo estimado de R$ 300 milhões.

A Ponte Itapaiúna será alternativa para os moradores do Portal do Morumbi, por exemplo, que precisam cruzar o rio no sentido Santo Amaro ou só voltar para o centro. A obra terá três faixas de rolamento e um vão-livre sobre o rio de 112 metros.

A 900 metros de distância e em fase de finalização – só faltam ajustes na sinalização das pistas –, a Ponte Laguna foi custeada inteiramente com recursos municipais arrecadados com a venda de títulos imobiliários dentro da Operação Urbana Água Espraiada, lei de 2001 – verba carimbada e já reservada no Orçamento. Apesar do dinheiro em caixa, a obra atrasou quatro meses. Na previsão inicial, a conclusão teria acontecido em dezembro. Agora, o plano é correr com a inauguração até o meio deste mês. A estrutura ligará o bairro do Brooklin à Rua Laguna, do outro lado do Rio Pinheiros. Tem três faixas e ciclovia com acesso direto ao Parque Burle Marx.

Complementares. As Pontes Laguna e Itapaiúna foram projetadas para operar de forma complementar. Com pistas de mão única em sentidos opostos, formam um sistema binário que, para funcionar a contento, precisa ser inaugurado conjuntamente. Para o consultor em Engenharia de Tráfego Flamínio Fichmann, com a abertura apenas de uma das obras, a Prefeitura só conseguirá aliviar o trânsito no sentido bairro e no período da tarde.

“Mas o maior nó no tráfego ali é registrado de manhã, na direção centro. Por isso, a administração deve cobrar da empresa a conclusão da Itapaiúna. Mesmo sendo uma obra de contrapartida, sem verba pública, deve ter o prazo cumprido”, diz. A Odebrecht, investigada na Operação Lava Jato, não informou o motivo da redução do ritmo das obras que, até o ano passado, estavam mais adiantadas que as da Ponte Laguna.

Responsável pela fiscalização, a Secretaria Municipal de Infraestrutura Urbana informou que a Itapaiúna está com 85% das obras concluídas. Segundo a pasta, apesar da complementaridade, cada uma pode atuar no trânsito de forma independente, uma vez que funcionam também como retornos sobre o rio. A expectativa é de que as pontes aliviem os gargalos existentes hoje sobre as Pontes João Dias e Transamérica, além da Avenida Guido Caloi, na mesma região. 

Até a conclusão da segunda ponte, porém, o número de carros nas pistas da Marginal, no sentido Interlagos, deve aumentar, podendo até piorar os congestionamentos na região de forma temporária.

Atrasos. O arquiteto e urbanista Valter Caldana explica que, apesar do atraso, as obras das pontes estão adiantadas em relação a outras obras de transportes, como corredores de ônibus. Haddad, até agora, só está construindo 66,3 quilômetros dos 150 km que prometeu há quatro anos. Para o especialista, a complexidade de obras direcionadas ao transporte de massa explica parte da demora. Os corredores também são alvo de questionamentos do Tribunal de Contas do Município (TCM).

“Historicamente atrasamos o planejamento inicial por falhas em projetos, redução de investimentos e opção política mesmo. Construir pontes é mais fácil, apesar de não parecer. Seguimos um padrão já conhecido e que funciona. Mas o resultado dessa escolha é ruim para a cidade”, diz.

Para Fichmann, uma solução seria usar mais recursos de operações urbanas em obras de transporte público ou exigir de grandes empreendimentos corredores, em vez de pontes.